A doença de Leber é uma atrofia do nervo óptico, irreversível, resultante de uma mutação genética e que se manifesta, principalmente, nos homens, sendo as mulheres transmissoras, é um tipo de distrofia retiniana, com herança autossômica recessiva, que causa cegueira infantil. A doença manifesta-se por rápida perda de visão central, afeta os dois olhos simultaneamente ou sequencialmente e, a perda de visão completa ocorre em dois ou três meses. A recuperação de uma visão útil num ou nos olhos pode acontecer anos depois, em 10% dos doentes é a designação de um grupo de distrofias retinianas de acometimento precoce, de caráter hereditário, caracterizada por deficiência visual moderada a severa identificada nos primeiros meses de vida, nistagmo, respostas pupilares pobres. A partir do locus alterado são descritas 5 formas da doença: Na maior parte dos caso a transmissão é de modo autossômico recessivo, apesar de casos descritos com transmissão dominante, e a heterogeneidade dos achados descritos na literatura reforça a impressão de que não de trata de uma entidade única. Há uma baixa acuidade visual variável em pessoas com Amaurose Congênita de Leber, de 20/80 até a percepção luminosa, podendo apresentar-se ao nascimento ou nos primeiros dez anos de vida associada à retinose pigmentar, redução do campo visual (campo tubular), nistagmo (tremor dos olhos), cegueira noturna, não-detectável ou grave redução das respostas à eletroretinografiaSão descritos vários achados associados à ACL ( Amaurose Congênita de Leber), oculares, renais e neurológicos entre outros.
Características clínicas
Durante os primeiros meses de vida os pacientes desenvolvem nistagmo ou "roving eyes". A acuidade visual varia de 20/200 a ausência de percepção luminosa; raramente é melhor que 20/200 (6% 20/50). Outros achados oculares são hipermetropia, estrabismo, ceratoglobo, catarata, ceratocone, blefarofimose, microcórnea, buftalmo, oftalmoplegia externa, fotofobia não relacionada à alterações corneanas.
Neurológicas
Não existe na literatura consenso quanto ao binômio disfunções do Sistema Nervoso Central e Amaurose de Leber. Tipicamente a criança com cegueira congênita apresenta hipotonia, atraso na aquisição dos marcos do desenvolvimento motor e dificuldades de orientação e mobilidade que podem resultar exclusivamente da privação sensorial em períodos críticos do desenvolvimento, sem outras disfunções associadas do SNC. Nas pessoas com A. de Leber, embora estes sejam achados esperados devido à deficiência visual, são também descritos defeitos estruturais do SNC. Alguns destes achados não apresentam relação clara com o retardo mental, o atraso neuromotor ou ainda com o quadro oftalmoscópico, dilatação ventricular moderada, alargamento de sulcos, malformações cerebrais menores diversas, mas outras alterações são contudo mais importantes - hipoplasia do vermis cerebelar ou do cerebelo, encefalocele, micropoligiria e imaturidade de neurônios corticais . Inversamente, também são descritos pessoas com A. de Leber, inicialmente com diagnóstico de retardo mental que mais tarde demonstraram inteligência normal.
Uma das implicações do acometimento neurológico e psicomotor na A. de Leber diz respeito às suas possibilidades educacionais. Nickel e Hoyt constataram que apesar das alterações neurológicas encontradas elas não necessariamente determinam retardo mental ou impossibilidade de aprendizado. O tipo de acometimento da retina e do SNC leva a pensar em alterações precoces desencadeadas por mecanismo idêntico e durante um mesmo estágio do desenvolvimento, geneticamente determinadas. Outros achados neurológicos descrito em associação à ACL são surdez (neurossensorial, não especificada, autismo, disfunção neuromuscular, hemiparesia, microcefalia, convulsões, hidrocefalia.
Evolução da acuidade visual
Em estudos onde foi possível a avaliação seriada da acuidade visual pode-se observar melhora, piora e estabilidade, sem contudo um padrão definido de evolução. Fulton e cols não encontraram associação estatisticamente significativa entre o curso da acuidade visual e dados clínicos como grau de hipermetropia, severidade das anormalidades de fundo de olho e "status"complicado/não complicado. Para se conhecer a acuidade visual - pontual ou sua evolução de pessoas com A. Leber, esta deve ser avaliada.
Diagnóstico diferencial
Uma vez que o mecanismo da doença ainda não é conhecido, a ACL é um diagnóstico de exclusão, além de não ser definitivamente um fato consumado. Alguns pacientes com diagnóstico inicial de A. Leber posteriormente recebem outros diagnósticos (cegueira noturna estacionária congênita, acromatopsia, retinose pigmentar infantil, assim como o inverso também é descrito na literatura. Lambert e cols e Casteels e cols ressaltam que crianças com diagnóstico de Leber devem ser observadas quanto a atraso no desenvolvimento neuro psicomotor e caso este ocorra mais acentuadamente que o esperado pela deficiência visual outros diagnósticos devem ser pesquisados.
Discussão
A conduta junto a pessoas com A. de Leber será norteada pela idade do paciente e pelo motivo que o levou à consulta investigação de nistagmo (no 1° ano de vida), desatenção visual, atraso do desenvolvimento ou reabilitação a partir de um diagnóstico. Na avaliação visual destas pessoas quanto mais informações subjetivas e objetivas obtivermos sobre o seu status visual, mais subsídios serão obtidos no planejamento da reabilitação e no acompanhamento da doença propriamente dita. A avaliação da acuidade visual, como já foi mencionado, é importante, apesar de nem sempre conseguirmos realizá-la com os testes de olhar preferencial ou tabelas de optotipos. Pode – se, entretanto, avaliar o desempenho visual nestes casos, observando a atenção, o interesse por objetos apresentados, o acompanhamento de objetos, da face do examinador, contato visual, respostas como o sorriso, percepção de objetos no espaço, etc. Em casos mais difíceis podemos proceder a avaliação à penumbra, com objetos iluminados ou com brilho.
O restante da avaliação oftalmológica deve também ser o mais completa possível, devido aos achados oculares descritos que podem corroborar o diagnóstico, interferir no desempenho visual (ceratocone, alta hipermetropia, catarata, por exemplo) ou ainda que levem a outras hipóteses diagnósticas.
Os exames eletrofisiológicos são importantes, assim como exames de imagem do SNC, entretanto um ERG extinto não determina que a estimulação visual não seja indicada. Mais recentemente o potencial evocado visual de varredura vem sendo utilizado para a estimativa da acuidade visual em crianças, mas pode ser não confiável em pacientes com nistagmo ou com o eletroencefalograma muito alterados. Crianças com deficiência visual moderada a severa tendem a apresentar melhor acuidade visual quando avaliada pela técnica de olhar preferencial.
Quanto às condutas médicas, além o tratamento de condições associadas (catarata, estrabismo, buftalmo, etc), é muito importante a atenção às ametropias presentes, principalmente a alta hipermetropia. Mesmo com respostas visuais pobres, a prescrição da correção óptica deve ser considerada. Algumas vezes, se há uma dificuldade de acomodação podemos realizar uma hipercorreção com a finalidade de estimulação para perto - principalmente nos nos bebês.
A estimulação visual em geral não é realizada pelo oftalmologista, mas a orientação da família e o trabalho em parceria com o profissional responsável são essenciais. Diferentemente do adulto, onde as funções visuais já estão consolidadas, o lactente está num período crítico de desenvolvimento destas funções, que dependem de condições favoráveis para seu acontecimento. A criança aprende a ver com a experiência visual e é este sentido - a visão - o principal motivador do desenvolvimento global, especialmente o motor. Além de graves atrasos globais do desenvolvimento, o lactente com experiências visuais pobres pode ainda desenvolver mecanismos compensatórios indesejáveis como os maneirismos (sinal óculodigital, auto-estimulação sonora, desvios comportamentais), trabalhados também na estimulação. Na realidade o termo habilitação visual é mais apropriado no que diz respeito a este trabalho e quanto mais precoce seu início melhor será o seu funcionamento ao longo da vida.
Nas demais faixas etárias o trabalho de reabilitação será pautado pela visão residual e pelas necessidades do paciente, o que também dependerá do seu nível cognitivo e dos resultados da estimulação precoce. Muitas vezes a visão muito baixa impossibilita o uso de recursos ópticos, sendo necessários recursos de substituição; o treinamento em orientação e mobilidade também deve ser lembrado. Como A. de Leber pode cursar com piora das funções visuais as necessidades das pessoas acometidas pela Sindrome podem se modificar ao longo do tempo.
Conclusão
Pacientes com nistagmo, alterações do desempenho visual e sem alterações fundoscópicas podem ser pessoas com Amaurose de Leber. O ERG é importante no diagnóstico diferencial. Quanto à acuidade visual, apesar de seu importante comprometimento, deve ser sempre e repetidamente avaliada não existe um padrão esperado de sua evolução. Quanto ao comprometimento do SNC não existe um consenso, mas algumas alterações estruturais podem ser efetivamente encontradas.
Quanto à capacidade cognitiva, das pessoas com leber parecem ser semelhantes a outras crianças com cegueira congênita e por isso devem ser adequadamente habilitados, apesar de casos descritos de retardo mental em graus variáveis.
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